A pouco mais de um mês das presidenciais norte-americanas, o primeiro debate entre Donald Trump e Joe Biden ficou marcado pela troca de insultos pessoais – “não há nada de inteligente em ti, Joe [Biden]”, disse o presidente sobre o adversário democrata, que por sua vez chegou a apelidar o republicano de “palhaço” e a mandá-lo calar. Transformaram o debate num verdadeiro desastre, resume a CNN, e no pior desde que existem debates na televisão norte-americana, concordam os comentadores políticos.
Trump atacou e ofuscou o oponente ao longo dos 90 minutos, sem intervalos comerciais, do evento, interrompendo Biden e o moderador Chris Wallace a todo momento. O jornalista da Fox News tentava recuperar o controle do debate, mas não conseguia.
Diversas vezes Biden chamou Trump de “racista”, “mentiroso”, “fantoche” de [Vladimir] Putin” e “sem conhecimento” do que diz.
Durante um determinado momento, no qual o foco era protestos, violência e polícia, Trump tentou ligar Biden às manifestações contra violência policial e as mortes de George Floyd, Breona Taylor e outras vítimas, mesmo com o democrata condenando os actos violentos.
O presidente disse ainda que as periferias dos EUA vão “desaparecer” se Biden for eleito. “Ele não conheceria uma periferia a menos que errasse o caminho”, respondeu Biden, acrescentando que a gestão de Trump com relação à crise de covid-19 e às mudanças climáticas prejudicaram ainda mais as áreas mais carentes.
O assunto terminou com Trump recusando-se a condenar os supremacistas brancos quando pressionado a fazê-lo por Wallace e Biden, momento em que foi mencionada a manifestação em Charlottesville, Virgínia, em 2017. “Recuem e fiquem na sua”, disse ele, dirigindo-se ao grupo supremacista Proud Boys.
ELEIÇÕES
No meio de uma campanha de desinformação e mentiras ditas sobre a votação pelo correio, Trump fracassou em responder a única pergunta feita a ele sobre o assunto: se iria encorajar seus apoiantes a serem pacíficos caso os resultados das eleições não sejam claros.
“Estou encorajando meus apoiantes a irem às urnas e prestarem atenção”, afirmou ele. O presidente ainda voltou a dizer que não vai aceitar o resultado, dependendo das circunstâncias. “Se eu vir milhares de urnas a serem manipuladas, não poderei aceitar”.
Trump defendeu que o voto por correio vai levar a “fraude como nunca vimos”, exagerando em vários exemplos que deu, enquanto Biden disse que “ninguém conseguiu provar que existe fraude relacionada com o voto por correio”.
COVID-19
Se Trump tem uma estratégia especial para os últimos dias de campanha é a de desviar a atenção da pandemia do novo coronavírus, que já matou mais de 1 milhão de pessoas em todo o mundo. Para muitos eleitores, a crise causada pela doença é mal administrada pelo presidente.
E se o objectivo do republicano era esconder os números do país sobre isso, teve certo sucesso. Apesar das tentativas de Biden de colocar o assunto em discussão, o debate acabou contando com alguns poucos argumentos, mas não se centrou nisso.
Trump disse que o processo de desenvolvimento da vacina é algo político e zombou de Biden por usar máscara. Em vez de defender suas próprias acções, o republicano só alegou que o democrata na presidência teria feito pior.
Por sua vez o democrata alegou que Trump desvalorizou a pandemia, algo que o próprio presidente confirmou em entrevistas com o jornalista Bob Woodward, dizendo que sabia que o vírus era perigoso e mais mortífero que a gripe comum, mas quis desvalorizar porque não quis (e ainda não quer) gerar pânico.
Trump acusou também Biden de ter sido “um desastre” durante a pandemia de H1N1, em 2009, mas o vice-presidente não era responsável pela resposta federal nesse caso e além disso a Administração Obama respondeu mais rapidamente após ter sido detectado o primeiro caso nos EUA – viriam a morrer cerca de 12 500 pessoas, face aos mais de 200 mil já registados na pandemia de covid-19.
SUPREMO TRIBUNAL
Sobre o Capitólio, o assunto dominante foi a indicação de Amy Coney, feita por Trump para ocupar a vaga deixada no Supremo Tribunal por Ruth Bader Ginsburg.
Mas embora o debate tenha sido aberto com perguntas sobre o Supremo, os detalhes perderam-se no meio do caos em que a discussão se tornou, com Trump interrompendo as perguntas feitas por Biden e Wallace lutando para fazer a mediação.
“PALHAÇO”
Biden respondeu várias vezes às interrupções de Trump revirando os olhos, negando com a cabeça e comentários como “por favor, homem”. Nunca perdeu a paciência, mas deixou claro o que acha do presidente.
O primeiro exemplo disso aconteceu aos 18 minutos do debate, quando Biden respondeu a uma série de interrupções de Trump dizendo: “Você quer calar a boca, homem?”. “Você é o pior presidente que os EUA já tiveram. Por favor”, afirmou o democrata em meio a discussões sobre impostos e economia. “É difícil falar com este palhaço”.
IMPOSTOS
O presidente insistiu na ideia de que pagou “milhões de dólares” em impostos, apesar de a investigação do The New York Times ter mostrado que não o fez.
Contudo, também deixou claro que como qualquer cidadão, “não quer pagar impostos” e procura todas as formas de dedução para reduzir o que paga.
Pressionado por Biden para apresentar provas, Trump disse “vocês vão ver” – no passado já disse que divulgaria as declarações de impostos e nunca o fez.
FAMÍLIA
Demorou 45 minutos para Trump mencionar a família de Biden. O republicano e seus aliados fazem repetidamente comentários alegando que o ex-vice-presidente e seu filho Hunter Biden agiram de forma corrupta com relação a assuntos ligados à Ucrânia.
Alguns democratas estavam curiosos para saber como Biden responderia, e se perderia a paciência. Porém, em vez disso, ele pareceu preparado e falou directamente para a câmeara, alegando que seu filho agiu de forma errada ao fazer parte do conselho de uma empresa de energia ucraniana, quando Biden era vice.
“Não se trata da minha família ou da família dele, trata-se da sua família, o povo norte-americano”, declarou Biden. “Ele não quer falar sobre o que vocês precisam”.
Mas Trump continuou retomando o assunto. Em vez de responder às perguntas sobre a visão que tem do exército, ele voltou a falar em Hunter Biden, incluindo seu vício em drogas. Neste momento, Joe Biden se virou para a câmara novamente: “Meu filho teve um problema com drogas, mas o superou e estou orgulhoso dele”.
O momento foi particularmente forte e pode ajudar o democrata a ganhar o voto de milhões de norte-americanos cujas famílias enfrentam o vício em drogas e álcool.
Redacção com CNN e DN