Dos cerca de 70 portugueses que foram enviados para os campos de concentração e extermínio da Alemanha Nazi, quatro são minhotos, dois dos quais naturais de Vila Verde. Um sobreviveu. Do outro, natural de Cabanelas, pouco se sabe. Terá fugido durante a viagem de combóio para o Campo de Concentração de Neuengamme? Ou não resistiu, como milhares de outros presos, ao terrível trajecto até à pequena localidade nas imediações de Hamburgo, na Alemanha?
A identificação e as histórias destes vilaverdenses – os restantes minhotos são de Famalicão e Arcos de Valdevez – foram descobertas pelo P2, o segundo caderno do jornal Público que, em parceria com o Instituto de História Contemporânea da Universidade Nova de Lisboa, investiga desde 2014 os prisioneiros lusos enviados para a morte nos campos de extermínio de Adolf Hitler.
Entre os presos portugueses, cujo o número é, segundo os investigadores, muito superior às sete dezenas de casos conhecidos, muito deram entrada nos campos de concentração identificados como “presos políticos”, mesmo sendo acusados de crime menores, como, exemplifica o P2, roubar uma bicicleta, roubar legumes ou matar uma vaca.
O CACETEIRO
Curiosamente, o que se sabe sobre Domingos da Cunha, nascido em Cabanelas, Vila Verde, em finais de 1904, deve-se a Sandra Costa, professora de História na Escola Secundária da Maia e dos seus alunos.
O vilaverdense foi alcunhado de ‘o Caceteiro’ pelos alunos, dado o seu historial passagens pelas prisões francesas por agressões à facada.
À última edição de Maio do P2, a docente conta que o homem, emigrante em França desde a década de 30, recebeu, no final de mais uma condenação, a ordem de expulsão do país, já ocupado pelos nazis, para Portugal.
Considerado “particularmente violento” foi mandado, em Fevereiro de 1944, para o Campo de Voves, de onde foi enviado para a Alemanha, com destino ao Campo de Concentração de Neuengamme, após um grupo de detidos ter conseguido fugir aos SS, a principal agência de segurança, vigilância e terror na Alemanha e na Europa ocupada pela Alemanha.
A partir daqui, não há qualquer registo de Domingos da Cunha, nem mesmo a sua entrada naquela ‘fábrica industrial’ de morte. Poderá ter conseguido fugir ou não ter sobrevivido à viagem de comboio.
O INJUSTIÇADO
História bem diferente, e com um desfecho feliz, é a de Manuel Alves, nascido em Vila Verde, em Novembro de 1910.
Com a chegada dos alemães a Nantes, onde estava vivia, Manuel perde o emprego. Com a companheira gravemente doente, o minhoto deixa de pagar o quarto. O senhorio apresenta queixa na polícia.
O caso é investigado pelas autoridades francesas que concluem que “é por necessidade e não por má vontade que Alves não pode cumpri os prazos do aluguer”. Mesmo assim, a Gestapo, a polícia secreta oficial da Alemanha Nazi e na Europa ocupada pelos alemães, prende-o em Março de 1943 e é condenado por “roubo e mercado negro”.
É deportado para o Campo de Buchenwald e depois transferido para um campo existente em Flossenburg. Sobreviveu à detenção e à guerra e regressa a Nantes, onde continuou a viver. Aparentemente, não regressa a Portugal.
A Associação de Deportados e Familiares de Desaparecidos de Flossenburg, que recolheu estes dados, afirma ao P2, que Manuel Alves “parece ter sido vítima de uma injustiça e de um erro”.
O FALSO PRESO POLÍTICO
Nascido em Abril de 1922 na freguesia de Castelões, Famalicão, Cândido Ferreira emigrou com os pais para França. Tinha seis anos.
Foi condenado em 1943, a um ano de prisão, por “roubo de colheitas”.
Enquanto aguardava a sua deportação para Portugal, é enviado para o Campo de Buchenwald, onde se encontrava o vilaverdense Manuel Alves.
Apesar dos esforços do prefeito de Haute-Goronne para que seja enviado para a sua terra natal, Cândido ingressa no campo identificado como “preso político”, mesmo não lhe ser conhecida qualquer actividade ou opiniões políticas.
Morreu em Buchenwald às mãos dos nazis.
O RESISTENTE
Se o famalicense era um falso preso político, já João António Fernandes não o era: lutou com a Resistência francesa contra a ocupação alemã.
Natural de Gandoriz, Arcos de Valdevez, onde nasceu em Junho de 1911, João António emigrou para França com 18 anos. Juntou-se à Resistência, foi capturado em combate e passou por três campos de concentração: Dachau, Mauthausen e Natzweiller.
Foi libertado deste último, e temível campo, pelo exército norte-americano. Regressou à sua casa em França, corria o ano de 1945, para os braços de uma companheira francesa muito mais velha e de bastantes posses, relata o P2.
Dada a sua idade avançada, a companheira aconselha João António a regressar a sua terra natal e casar-se.
Assim fez. Trinta anos depois regressa à aldeia de Lombadinha, já com 50 anos, onde era dado já como morto. Casou com uma mulher de 38 anos e fixou-se na aldeia.
Apesar de nunca se ter naturalizado, foi condecorado várias vezes pelo Estado francês.
Fernando Gualtieri (CP7889 A)