O parlamento chumbou esta sexta-feira duas propostas do BE e do PCP que pretendiam estabelecer um regime de exclusividade no Serviço Nacional de Saúde (SNS), que a maioria dos restantes partidos considerou não ser uma resposta aos problemas do sector.
Os diplomas eram, em quase tudo, semelhantes e foram ambos rejeitados pelo PS, Chega e Iniciativa Liberal, com a abstenção do PSD, contando apenas com os votos favoráveis do PCP, BE, PAN e Livre.
Em causa estava a proposta de um regime de exclusividade para médicos, enfermeiros e, eventualmente, outros profissionais do SNS, de carácter voluntário para a maioria, mas obrigatório para cargos de direcção, e com incentivos como uma majoração remuneratória em 50% na proposta do PCP e em 40% na iniciativa do BE.
“Este regime não é apenas indispensável enquanto solução que estanca a saída de profissionais, é também a solução que profissionais de saúde empenhados e comprometidos com o SNS pedem”, tinha afirmado, momentos antes da votação, o deputado João Dias, do PCP.
Durante o debate em plenário das iniciativas, João Dias justificou a proposta do PCP sublinhando a necessidade urgente de responder à carência de médicos no SNS, neste caso através de uma medida que, no entender dos comunistas, permite fixar mais profissionais de saúde no sector público, ao mesmo tempo que os valoriza.
Também o BE apontou a valorização dos profissionais e, começando por destacar o elevado número de pessoas que, em Portugal, não têm médico de família, Pedro Filipe Soares sublinhou que a falta de profissionais de saúde é transversal no SNS “porque as carreiras não são atractivas”.
O regime de exclusividade que o partido propõe, acrescentou o bloquista, é uma porta para a valorização dos profissionais que se queiram dedicar, de forma exclusiva, ao SNS. E quanto aos custos da medida, Pedro Filipe Soares alertou que serão muito superiores se o problema da falta de médicos, em particular, se prolongar.
Da parte do PS, a deputada Susana Correia recordou a aprovação do novo estatuto do SNS que prevê a criação de um regime de dedicação plena voluntário, inicialmente apenas para os médicos, e incompatível com o exercício de funções de direcção técnica, coordenação e chefia em instituições privadas e do sector social de prestação de cuidados de saúde, mas exclui os consultórios médicos de profissionais individuais.
“Actualmente, vivemos uma grande complexidade na área saúde, que desafia os decisores para a responsabilidade da sustentabilidade e eficiência dos sistemas de saúde. É neste compromisso que o Governo e o PS aprovaram o novo estatuto do SNS”, afirmou a socialista.
Já Pedro Melo Lopes, do PSD, lembrou que o regime de exclusividade já existiu, e partiu de uma iniciativa dos sociais-democratas, tendo sido abandonado em 2009 pelo Governo liderado por José Sócrates.
“Não temos dúvidas que a exclusividade opcional, respeitando a liberdade individual, permite atrair jovens mais talentosos, renovar o sistema”, afirmou, rejeitando, no entanto, a obrigatoriedade prevista nas duas iniciativas e defendendo, por outro lado, que “de nada serve um modelo remuneratório mais atractivo, se não for acompanhado de uma profunda reforma em todo o sistema de saúde”.
A necessidade de uma reforma profunda foi também defendida pela Iniciativa Liberal, com a deputada Joana Cordeiro que, acusando o PCP e BE de preconceito ideológico, insistiu antes num “sistema nacional de saúde que assegura a verdadeira universalidade no acesso”, independentemente de ser através dos sectores público ou privado.
Além das propostas do PCP e do BE, foi também votado um projecto que altera o estatuto do SNS, estabelecendo que o Estado celebre protocolos com os estabelecimentos e serviços prestadores de cuidados ou de serviços de saúde do sector privado e social “sempre que se mostre necessário ao cumprimento do direito à protecção da saúde”.
A iniciativa foi chumbada com os votos contra do PS, PCP, BE e Livre e a abstenção do PSD, Iniciativa Liberal e PAN.
Durante o debate, Pedro Frazão, do Chega, disse que o actual SNS não serve nem os utentes, nem os profissionais de saúde e, a propósito dos 43 anos celebrados na quinta-feira, classificou-o como “um tipo de meia-idade, frustrado e sempre mimado pela família de esquerda”.
A deputada Inês de Sousa Real, do PAN, e o deputado Rui Tavares, do Livre, colocaram-se ambos do lado do PCP e do BE e justificaram os seus votos favoráveis com a necessidade de uma discussão mais profunda, em sede de especialidade, de respostas para alguns dos problemas do SNS.
PROPOSTAS DO CHEGA
A Assembleia da República rejeitou também as propostas do Chega para constituir duas comissões de inquérito parlamentar, uma sobre a credibilidade dos dados relativos à segurança interna e outra sobre o aumento da mortalidade.
As duas propostas apenas tiveram votos favoráveis do Chega e da IL, contando com a abstenção do PSD e votos de rejeição das restantes bancadas e deputados.