O Brasil é o epicentro da pandemia de covid-19 na América Latina e os seus vizinhos mostram-se preocupados com a evolução da crise no maior país da América do Sul, onde o presidente Jair Bolsonaro se opõe publicamente às medidas restritivas para conter o avanço da doença.
O Brasil, que regista este domingo 10.627 mortes e 155.939 casos confirmados do novo coronavírus, segundo o Ministério da Saúde do país, faz fronteira com dez países: Colômbia, Venezuela, Guiana, Suriname, França (através da Guiana Francesa), Peru, Bolívia, Argentina, Paraguai e Uruguai.
Para se ter uma ideia da magnitude da crise no Brasil, os países fronteiriços somam, juntos, 85.767 mil casos confirmados de infecção por coronavírus., segundo o mapa do Center for Systems Science and Engineering da universidade americana de Johns Hopkins.
Muitos especialistas consideram que o total de contagiados no Brasil poderá ser 15 vezes superior ao informado pelas autoridades brasileiras, pois só são feitos testes de detecção em pacientes graves.
Por isto, à espera de que o pico da pandemia chegue nos próximos dias em diferentes pontos da América Latina, vários países observam com preocupação o seu vizinho, enquanto Bolsonaro desvaloriza a gravidade da pandemia e incentiva a população a desrespeitar as medidas de distanciamento social impostas por governadores e prefeitos para tentar contê-la.
Na Argentina, que mantém uma quarentena nacional desde 20 de Março, o presidente Alberto Fernández expressou várias vezes a sua inquietação devido ao avanço da epidemia no Brasil e a atitude de Bolsonaro.
“Obviamente que é um risco muito grande (…) Aqui estão a entrar camiões do Brasil a transportar cargas de São Paulo, que é um dos locais mais infectados” do país, declarou Fernández esta quarta-feira à Rádio con Vos.
Há algumas semanas, durante entrevista ao portal El Cohete a la Luna, Fernández já havia lamentado que, no Brasil, principal parceiro comercial da Argentina, “ninguém” estivesse “a responder ao problema do coronavírus com seriedade”.
“RISCO MUITO GRANDE”
No Paraguai, parceiro do Brasil no Mercosul com Argentina e Uruguai, o governo recusou-se a abrir gradualmente a fronteira com o Brasil, como queriam os comerciantes da fronteiriça Ciudad del Este.
O presidente Mario Abdo Benítez ordenou, pelo contrário, redobrar o controlo militar nas principais passagens fronteiriças para evitar a entrada de doentes com covi-19 no país.
“A velocidade de propagação do coronavírus no Brasil representa um risco muito grande a qualquer eventual abertura”, reforçou o ministro de Saúde paraguaio, Julio Mazzoleni, durante uma conferência de imprensa.
Na terça-feira, o Uruguai anunciou um aumento do controlo sanitário na fronteira com o Brasil ao ver com “preocupação” a existência de casos de coronavírus em cidades fronteiriças do país, informou o secretário da Presidência, Álvaro Delgado.
Embora o Uruguai tenha proibido a entrada de estrangeiros para conter a pandemia, ficaram isentos residentes de cidades que fazem fronteira com o Brasil, que frequentemente moram de um lado e trabalham do outro.
TEMOR NA AMAZÓNIA
Na Colômbia, o governo de Iván Duque não demonstrou preocupação com o Brasil, mas a situação no país vizinho gera alarme nos estados amazónicos.
Embora Bogotá tenha decretado o encerramento das fronteiras terrestres a 16 de Março, estas são “muito porosas, há muitas partes por onde se pode passar”, advertiu à AFP Daniel Oliveira, administrador do departamento (estado) do Amazonas.
Neste departamento, situado na fronteira com o Brasil, há 30 casos de coronavírus por 10 mil habitantes, a pior cifra do país, à frente de Bogotá, com quatro casos pelo mesmo número de pessoas.
Em Letícia, capital da província, dos dez primeiros casos detectados, cinco foram importados do país vizinho.
A região amazónica colombiana, despovoada e pobre, é especialmente vulnerável. 58 por cento da sua população é indígena e está em “risco de extinção” devido à pandemia, alertou a Organização Nacional Indígena da Colômbia (ONIC).
“Aqui não há água potável, o sistema de saúde é muito precário (…) Se o vírus se espalhar nos territórios, as mortes seriam inimagináveis”, advertiu Arley Cañas, membro do povo Inga, na reserva Uitiboc.
Na Venezuela, o governo de Nicolás Maduro tem multiplicado as críticas a Bolsonaro e qualificado de “grande ameaça” para o seu país a proximidade do Brasil devido à “estupidez” do presidente brasileiro.
“A irresponsabilidade dele levou milhares de brasileiros a contagiarem-se. Levou à morte de milhares”, disse Maduro sobre Bolsonaro, um dos seus adversários na região e que já o qualificou várias vezes de “ditador”.
Segundo a imprensa local, o governador do estado fronteiriço de Bolívar, Justo Noguera, avaliou que no começo do mês, 1.600 venezuelanos tinham voltado ao país através das passagens fronteiriças com o Brasil durante a emergência provocada pelo novo coronavírus.
SITUAÇÃO NO BRASIL
Brasil registava este domingo 10.627 mortes, das quais 730 nas últimas 24 horas, e 155.939 casos confirmados, mais 10.701
A taxa de mortalidade de 6,8% no país.
O estado de São Paulo continua a ser o epicentro da doença com 44.411 casos confirmados e 3.608 mortos. Em seguida aparece o estado do Rio de Janeiro, onde a covid-19 já infectou 16.929 pessoas e causou 1.653 mortes.
Por outro lado, os estados do Mato Grosso do Sul (346 casos e 11 mortos) e Mato Grosso (502 casos e 16 mortes) registaram as menores taxas de infecção e de mortes no Brasil.
Enquanto os casos do novo coronavírus aumentam no país, as medidas de isolamento social e a posição de autoridades sobre a doença motivaram reacções opostas.
Ao longo do dia de sábado, centenas de apoiantes do Presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, organizaram uma caravana de carros em seu apoio, em Brasília. Os manifestantes também empunhavam cartazes contra representantes do Congresso e do Supremo Tribunal Federal (STF), órgão judicial máximo do país.
Já Bolsonaro tornou-se centro de uma nova polémica ao cancelar um churrasco, que deveria ocorrer em sua residência oficial, o Palácio da Alvorada.
O Presidente brasileiro usou as redes sociais para dizer que a informação de que faria o churrasco era mentira, embora ele mesmo tenha mencionado a festa diante de jornalistas e apoiantes em declarações gravadas ao longo da semana.
Durante a tarde, o Presidente brasileiro foi fotografado por um portal de notícias chamado Metrópolis andando de moto aquática no lago Paranoá, em Brasília.
Por outro lado, os presidentes da câmara baixa, Rodrigo Maia, e da câmara alta, Davi Alcolumbre, do Congresso brasileiro, decretaram luto oficial de três dias para homenagear os mortos pela covid-19, que neste dia superaram a marca de 10 mil no país.
Redacção com Agências