O Ministério Público (MP) acusou de prevaricação dois antigos vereadores socialistas da Câmara de Barcelos por alegado favorecimento de um empresário “amigo” num concurso, lançado em 2015, para substituição de luminárias com lâmpadas de descarga por luminárias LED.
Em nota publicada esta quarta-feira na sua página, a Procuradoria-Geral Regional do Porto não refere o nome dos arguidos, mas fonte judicial disse à Lusa que são Domingos Pereira, então vice-presidente da Câmara, e Alexandre Maciel, na altura com o pelouro da Energia.
No processo, são ainda arguidos dois funcionários do município, membros do júri do concurso, e o empresário em causa, José Pereira, que em 2017 foi eleito vereador pelo movimento independente Barcelos, Terra de Futuro (BTF), entretanto fundado por Domingos Pereira.
Segundo o MP, os arguidos causaram um prejuízo de 248.585 euros à autarquia e ao Fundo de Eficiência Energética, que co-financiou a intervenção em 85% do valor total.
O MP considerou “fortemente indicado” que, no âmbito de um concurso público publicado em Diário da República a 11 de Setembro de 2015, pelo município de Barcelos, para a substituição de luminárias com lâmpadas de descarga por luminárias LED, os arguidos, “que mantinham entre si relações pessoais de amizade ou interesses políticos comuns, delinearam um plano tendo em vista garantir a adjudicação da obra à empresa representada pelo empresário”.
Para o efeito, terão instruído, conduzido e decidido o procedimento em violação das regras da contratação pública e por um valor superior ao necessário para a execução dos trabalhos.
Ao procedimento, concorreram 11 empresas.
Para o MP, a violação das regras procedimentais e o favorecimento do arguido empresário, consistiram, desde logo, no encurtamento dos prazos do concurso sem justificação, privilegiando, dessa forma, a proposta do beneficiário e o afastamento de outros candidatos.
O MP aponta ainda a fixação de um preço “anormalmente baixo de 10% ou mais inferior ao preço base, contrariando as regras legais que fixam, em regra, 40%”.
Com isso, acrescenta a acusação, os arguidos garantiram o afastamento de sete das empresas concorrentes que apresentaram propostas abaixo do valor base.
“Simultaneamente, em face da coexistência de quatro propostas de idêntico valor, [houve] a sobrevalorização de determinados subfactores avaliativos da proposta da empresa beneficiada e desvalorização do mérito das outras propostas concorrentes, com a atribuição de menor pontuação nos subfactores de avaliação do critério de mais-valia técnica”, refere ainda a nota.
“LIMPO E TRANSPARENTE”
O MP diz também que o arguido empresário teria conhecimento prévio da tramitação do procedimento, “pois que, estando o mesmo ainda em fase de apreciação de propostas, já o arguido empresário, através da sociedade que geria, encomendava os materiais necessários à execução da empreitada”.
Contactado pela Lusa, Domingos Pereira disse que o processo foi “completamente limpo e transparente, feito com toda a lisura e igual a centenas e centenas de outros”.
“Eu só assinei, por ser o responsável da contratação pública. Assinei esse como assinei centenas e centenas de outros processos. Com toda a transparência, ponho as mãos no fogo. Só despacho e não tenho intervenção em rigorosamente mais nada”, acrescentou.
Domingos Pereira desfiliou-se do PS, fundou o movimento independente Barcelos, Terra de Futuro (BTF) e nas últimas autárquicas foi eleito vereador numa coligação liderada pelo PSD, mas entretanto pediu a suspensão do mandato, depois de ter sido condenado por corrupção.
A Lusa contactou também Alexandre Maciel, que se manifestou de “consciência tranquila” por tudo ter decorrido “dentro da legalidade”, sublinhando que o concurso foi visado pelo Tribunal de Contas e que o Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga não deu razão a um concorrente que impugnou o concurso.
Acrescentou que interveio em dois momentos, um deles antes do concurso, na definição do critério de adjudicação, factores de avaliação das propostas e fixação do preço anormalmente baixo.
Depois, na execução da obra, validou a conta final da empreitada, “porque o então presidente da Câmara, Miguel Costa Gomes, e o vice, Domingos Pereira, não estavam na Câmara e era necessário entregá-la antes do final de 2015, por causa do financiamento”.
Nas últimas autárquicas, Alexandre Maciel foi eleito vereador pelo PS, mas entretanto demarcou-se do partido, continuando a exercer o cargo como independente.
Também contactado pela Lusa, o então presidente da Câmara, Miguel Costa Gomes, disse estar convicto de que “não há matéria nenhuma” para a acusação.
Costa Gomes disse ainda que também tinha sido constituído arguido no processo, mas na terça-feira notificado de que, afinal, não irá a julgamento.