O ex-presidente da Câmara de Terras de Bouro Joaquim Cracel foi esta quarta-feira condenado pelo Tribunal de Braga a três anos de prisão, com pena suspensa, por ter aprovado o licenciamento de uma moradia ilegal em terreno de Reserva Agrícola Nacional (RAN).
Cracel foi condenado por um crime de prevaricação por titular de cargo político, ficando a suspensão da pena sujeita ao pagamento de 8.000 euros aos Bombeiros Voluntários de Terras de Bouro.
O tribunal aplicou ainda a pena acessória de perda de mandato, mas Joaquim Cracel já não exerce qualquer cargo autárquico, tendo deixado a presidência da autarquia em 2017.
Em causa no processo está a construção de uma habitação de Cátia Machado, irmã da então vereadora Liliana Machado, que integrava o executivo de Cracel.
Um engenheiro e um arquitecto da Câmara de Terras de Bouro também foram condenados em penas suspensas de dois anos e oito meses e de dois anos e quatro meses, respectivamente.
Para a suspensão da pena, o primeiro terá de pagar 6.000 euros aos Bombeiros de Terras de Bouro e o segundo 4.000 euros.
Também a irmã da vereadora foi condenada a dois anos e oito meses de prisão de pena suspensa, com a condição de pagar 6.000 euros aos bombeiros do concelho.
Segundo o despacho da acusação do Ministério Público, o antigo autarca e os dois técnicos agiram, em conluio, no mandato 2009-2013, para que Cátia Machado pudesse construir uma moradia em terreno de Reserva Agrícola Nacional (RAN).
O MP diz que, em 2010, a munícipe e arguida Cátia Machado quis construir uma habitação no lugar de Vau, na freguesia de Balança, no concelho de Terras de Bouro, tendo dado entrada nos serviços da Câmara, nesse ano, um processo de licenciamento de obras particulares.
Para o MP, todos os arguidos “sabiam que a área de implantação da habitação cujo licenciamento de construção estava a ser pedido violava norma expressa e imperativa do regime da Reserva Agrícola Nacional”.
“Agindo todos [os arguidos] de forma concertada, a arguida deu entrada ao pedido e o arguido presidente da câmara municipal, por decisões de Setembro e Dezembro de 2010, acolitado por pareceres favoráveis prestados pelos restantes arguidos, deferiu o licenciamento”, sustenta a acusação.
Para o tribunal, as decisões de Joaquim Cracel “foram tomadas por ele conscientemente, com a intenção de favorecer a arguida Cátia Sousa, proporcionando-lhe, de forma ilegítima, um benefício”.
Em tribunal, Cracel admitiu que foi “incauto” quando autorizou a construção da habitação em causa, mas sublinhou que estava convencido da legalidade da sua actuação.
Acrescentou que só quando se preparava para assinar o despacho é que soube, por duas funcionárias do município, das relações de parentesco da requerente com a vereadora do seu executivo.
No despacho, Cracel escreveu que, apesar das “limitações impostas” pela legislação então em vigor, deferia o licenciamento, por considerar que aquelas limitações não se ajustavam à realidade de uma família jovem.
Foi, assim, autorizada a construção de uma casa de tipologia T4, com uma área de implantação muito superior à que seria legalmente permitida.
A arguida também negou a prática de qualquer crime, sublinhando que entregou o processo de licenciamento a um gabinete de arquitectura, que “tratou de tudo”, razão pela qual nunca se dirigiu presencialmente à Câmara de Terras de Bouro.
Quanto ao facto de ser irmã de uma vereadora, a arguida afirmou que esta “nada tem a ver com o processo”, acrescentando que “nunca falaram” sobre este assunto, pois o mesmo sempre decorreu com normalidade e com todos os trâmites necessários.
Já o engenheiro arguido, à data dos factos chefe da divisão de Departamento de Urbanismo, classificou a acusação de “narrativa sem fundamento”, refutando também a prática de qualquer crime neste processo de licenciamento.
O arquitecto arguido disse que deu informação técnica “em consonância” com o parecer da Reserva Agrícola Nacional. Disse ainda que se fez valer de indicações que recolheu em “contactos informais” com outros municípios.