Morreu Jimmy Carter. James Earl Carter Jr. foi Presidente dos EUA de 1977 a 1981, mas o seu legado vai muito além da passagem pela Casa Branca. Homem de sorriso fácil, foi um pacificador incansável durante décadas, o que lhe valeu o Nobel da Paz em 2002.
Jimmy Carter foi Presidente dos Estados Unidos de 1977 a 1981, mas o seu legado vai muito além da passagem pela Casa Branca.
A carreira pós-presidencial em prol da democracia e da paz mundial, baseada no Carter Certer que fundou em Atlanta, justificaram o Prémio Nobel da Paz que lhe foi atribuído em 2002.
Nascido a 1 de Outubro de 1924, Jimmy Carter foi o Presidente que mais tempo viveu depois de sair da Casa Branca e foi também o Presidente norte-americano que alcançou maior longevidade, superando em 2019 a senioridade de George H.W. Bush, que morreu com 94 anos.
Rosalynn Carter, mulher e conselheira do antigo Presidente democrata morreu a 19 de Novembro, aos 96 anos, na sequência de uma prolongada demência e muitos meses de deterioração do seu estado da saúde. A antiga primeira-dama passou os últimos dias de vida em casa sob cuidados paliativos, em Plains, no estado da Georgia.
Foi também em Plains, cidade onde nasceu, que Jimmy Carter passou os últimos tempos de vida. Filho de uma família tradicional de Plains, que se dedicava ao cultivo de amendoim, começou por virar as costas à terra.
Formou-se pela Academia Naval dos Estados Unidos, no estado de Maryland, em 1946. Nesse mesmo ano casou-se com Rosalynn Smith, tiveram três filhos e uma filha. Após a morte do pai, em 1953, acabaria por regressar a Plains para administrar a exploração de amendoim da família.
DE PRODUTOR DE AMENDOIM A PRESIDENTE
Ingressou no Partido Democrata e foi eleito para a Assembleia Legislativa da Georgia em 1962 e em 1964. Foi governador da Georgia por um mandato no início da década de 70, no qual deu prioridade às políticas a favor dos direitos dos negros e das mulheres.
Seguiu depois na corrida à Presidência dos Estados Unidos. Foi escolhido pelo Partido Democrata para desafiar o Presidente Gerald Ford. Carter era um candidato tão improvável que o próprio admitiu que a mãe estranhou a sua candidatura e lhe perguntou: “Presidente de quê?”
Em resposta, com o objectivo de se tornar um nome reconhecido, começou a fazer campanha cedo. Foi uma luta renhida contra Ford, que acabou por vencer com uma escassa margem, uma vitória na qual beneficiou do impacto do escândalo Watergate.
Na tomada de posse, o novo Presidente e a mulher Rosalynn recusaram a limusina e caminharam do Capitólio até a Casa Branca, num estilo de simplicidade e proximidade, que acabou por marcar a sua passagem pela Presidência dos Estados Unidos.
PREOCUPAÇÃO AMBIENTAL
Jimmy Carter marcou pela diferença ao apostar numa política de conservação de energia, ao revelar uma sensibilidade e preocupação ambiental muito invulgares para a época. Mandou instalar painéis solares na Casa Branca e pediu aos norte-americanos maior cuidado no consumo energético.
“Aprendi cedo que se cuidarmos da terra, ela cuidará de nós”, disse Carter, que valorizava as suas origens próximas da natureza que lhe conferiram uma maior sensibilidade para as questões ecológicas. Estas motivações contribuíram para que fosse responsável pela criação dos departamentos de energia e educação.
A nível internacional, o acordo de paz entre Israel e o Egipto que Carter arquitectou em negociações pessoais em Camp David, em 1978, foi talvez o momento mais relevante do seu mandato.
Alcançou também a ratificação dos tratados que concederam aos Estados Unidos o controle do Canal do Panamá, retomou as relações diplomáticas totais com a China e, em 1980, quando a então União Soviética invadiu o Afeganistão, decidiu cancelar a participação dos desportistas norte-americanos nos Jogos Olímpicos de Moscovo.
Ainda com a antiga União Soviética, Jimmy Carter e Leonid Brezhnev assinaram o acordo SALT-II sobre limitações e directrizes relativas ao uso de armas nucleares. Contudo, o tratado nunca entrou formalmente em vigor e foi considerado um dos acordos EUA-União Soviética mais controversos da Guerra Fria.
CRISE DOS REFÉNS EM TEERÃO
O mandato de Carter acabou por se tornar atribulado. Carter liderou um país que enfrentava a subida das taxas de juro e da inflação. Alcançou conquistas importantes na política internacional, mas sofreu um sério revés com a invasão da embaixada dos Estados Unidos em Teerão.
A 4 de Novembro de 1979, estudantes, apoiados pelos guardas que faziam a segurança do edifício, invadiram a embaixada, em protesto ao apoio dado pela administração Carter ao Xá Reza Pahlavi, líder iraniano no exílio, derrubado por um movimento revolucionário que meses antes tinha transformado o Irão numa república islâmica teocrática, liderada pelo aiatolá Ruhollah Khomeini.
Mais de 50 pessoas estiveram como reféns na embaixada durante 444 dias. Carter tentou negociar e acabou por ordenar a tentativa de resgate militar que falhou desastrosamente. Oito americanos morreram naquele que foi o momento mais sombrio do mandato de Carter.
Durante a ocupação, um grupo de seis cidadãos norte-americanos fugiu e esteve escondido com a ajuda do embaixador canadiano. Uma operação, que acabou por inspirar o filme ‘Argo’, resgatou-os e levou-os para casa. Os restantes reféns só foram libertados após a derrota de Carter.
Os 52 reféns norte-americanos foram libertados em Janeiro de 1981, um dia depois da tomada de posse do republicano Ronald Reagan como Presidente dos EUA, depois de no ano anterior a missão das forças especiais norte-americanas ter fracassado.
CARTER CENTES E DIPLOMACIA
Depois da derrota e de um final de mandato conturbado, Carter retirou-se aos 56 anos para a cidade natal.
Em 1982, juntamente com a mulher Rosalynn, fundaram o Carter Center, uma organização sem fins lucrativos com o objectivo de promover a paz e os direitos humanos que oferecia “oportunidades superiores para fazer o bem”, como disse mais tarde o antigo Presidente norte-americano.
O homem que admitiu que muito o consideravam “um Presidente fracassado” acabou por se transformar no ex-Presidente mais activo a nível internacional.
“O meu papel como ex-Presidente provavelmente é superior ao de outros presidentes”, admitiu numa entrevista em 2010.
Carter considerou mesmo que o seu centro “preenchia os vazios no mundo. Quando os Estados Unidos não conseguem lidar com questões problemáticas, nós vamos lá”.
Carter foi “onde outros não foram”, como o próprio disse em 1994. Esteve na Etiópia, Libéria e Coreia do Norte, onde conseguiu a libertação de um norte-americano que tinha sido preso na zona de fronteira em 2010.
Ajudou a supervisionar processos eleitorais na Nicarágua, no Haiti e nas primeiras eleições palestinianas.
Com SIC Notícias