Um acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães ‘culpa’ o sistema penal e de saúde por alguns homicídios e outros casos de sofrimento humano, por não aplicarem a Lei de Saúde Mental, nomeadamente no que se refere ao internamento compulsivo.
“O sistema [penal e de saúde] não tem conseguido cumprir uma questão básica: se alguém parece doente, vai ao médico”, sublinha o acórdão, esta quinta-feira consultado pela Lusa e referente a um caso de violência doméstica.
No processo em causa, um homem é acusado de violência doméstica, por alegadamente, após o divórcio, perseguir e ameaçar a ex-mulher, movido por ciúmes.
Para a Relação de Guimarães, estes “comportamentos obsessivos e agressivos são altamente imprevisíveis”, nunca se sabendo até onde poderão chegar, mas sabendo-se que “muitas vezes culminam numa situação de homicídio”.
“São pessoas plenamente imputáveis, mas que, por virtude de situações ansiodepressivas ou características de personalidades fóbicas, obsessivas, ‘border-line’ ou psicopáticas, que não tanto psicóticas, adoptam comportamentos altamente lesivos, de que, muitas vezes, mais tarde se arrependem, não obstante antes não quererem tratamento”, lê-se no acórdão.
Os juízes que assinam o acórdão lembram que em Portugal vigora, desde 1998, a Lei de Saúde Mental, que abriu a possibilidade de internamentos compulsivos, independentemente da prática de crimes.
Apesar da lei, sublinham, “continua a verificar-se que, nestes casos, que são também psiquiátricos, o sistema não tem conseguido cumprir uma questão básica: se alguém parece doente, vai ao médico”.
“Alguma culpa há do sistema penal e de saúde [por não obrigar o doente a ir ao médico e determinar o seu internamento compulsivo, se for caso disso]”, acrescentam.
Para os juízes, trata-se de “uma questão básica para qualquer homem médio”, mas a que o sistema judicial e de saúde “ainda não conseguiu dar a resposta óbvia”, embora a situação “já tenha evoluído bastante, para melhor”.
“Assim se poderiam poupar muitas vidas e sofrimento humano, com que qualquer cidadão comum já se debateu ou conheceu, na sua vivência”, refere ainda o acórdão.
Vinca que em causa estão “realidades que não são, à partida, previsíveis e que podem ser muito graves, quer para o ofendido, quer para o próprio arguido”.
Fonte: Sapo24