A violência contra crianças em conflitos armados atingiu “níveis extremos” em 2023, com assassínios, mutilações e recrutamentos a liderarem as violações graves, incluindo em Israel e na Faixa de Gaza, denunciou esta quinta-feira a ONU.
Os dados fazem parte do relatório anual do secretário-geral da ONU sobre Crianças em Conflitos Armados, que alerta para ”um aumento chocante de 21% em violações graves” contra crianças com menos de 18 anos numa série de conflitos, como Sudão, Myanmar, Ucrânia, Congo, Burkina Faso, Somália, Síria, entre outros.
Na apresentação do relatório na sede da ONU, em Nova Iorque, a representante especial da ONU para Crianças e Conflitos Armados, Virgínia Gamba, indicou que em 2023 foram verificadas 32.990 violações graves contra crianças. Desse total, 30.705 foram cometidas no ano passado e as restantes ocorreram anteriormente, mas apenas foi possível verificá-las em 2023.
Pela primeira vez, o relatório da ONU colocou as forças israelitas na sua ‘lista da vergonha’ de países que violam os direitos das crianças, matando e mutilando menores e atacando escolas e hospitais.
Também identificou pela primeira vez militantes do grupo islamita Hamas e da Jihad Islâmica palestiniana por matar, ferir e sequestrar crianças.
AGRESSÕES SEXUAIS
Virgínia Gamba apontou para um aumento de mais de 155% de violações graves em relação aos anos anteriores no conflito em Israel e no Território Palestiniano Ocupado, nomeadamente em Israel e na Faixa de Gaza e na Cisjordânia Ocupada.
“No Sudão, assistimos a um aumento surpreendente de 480% nas violações graves contra crianças em espaços altamente povoados, como em Cartum e na região de Darfur”, sublinhou.
A nível global, as violações graves afectaram um total de 22.557 crianças, das quais 6.252 eram meninas, frisou Gamba, alertando para o aumento de raparigas raptadas para recrutamento e violência sexual, incluindo violação e escravatura sexual.
O assassínio e a mutilação estão no topo da lista de violações graves, com 11.649 crianças, seguindo-se o recrutamento e uso de 8.655 crianças em conflitos armados e, em terceiro lugar, o rapto de 4.356 menores de 18 anos.
Além disso, embora seja uma violação não incluída neste relatório, a ONU relatou 5.205 incidentes verificados de negação de acesso humanitário a crianças, “um número inaceitavelmente elevado, representando um aumento de 32% em relação aos anos anteriores”, destacou.
A violação e violência sexuais contra crianças, e os ataques a escolas e hospitais, também aumentaram ou permaneceram em “níveis excepcionalmente elevados”, com 1.650 ataques verificados a instituições de ensino e hospitalares, e 1.470 violações sexuais contra crianças em contexto de conflito, a maioria delas raparigas.
“A violência sexual tem sido historicamente subnotificada e, no entanto, este número já representa um aumento de 25% em relação aos ciclos de notificação anteriores”, destacou a representante das Nações Unidas.
Outro padrão percebido pela ONU durante 2023 foi que cerca de 50% das violações foram cometidas por grupos armados, incluindo aqueles designados como terroristas pelas Nações Unidas, enquanto o restante foi cometido por actores estatais enquanto se envolviam em conflitos armados com os seus oponentes, e por perpetradores não identificados, como minas terrestres.
Os grupos armados foram os principais responsáveis pelo rapto, recrutamento e pela violência sexual contra crianças, enquanto as violações mais prevalentes atribuídas a forças armadas estatais foram os homicídios e mutilações, incluindo a utilização de engenhos explosivos em áreas densamente povoadas, ataques a escolas e hospitais, entre outros.
Por outro lado, a ONU notou progressos na prestação de uma melhor protecção infantil em conflitos armados em alguns países, nomeadamente no Iraque, Moçambique, Filipinas, Sudão do Sul, Ucrânia e Iémen, todos os quais registaram diminuições no número de violações graves.
Por fim, mais de 10.600 crianças anteriormente associadas às forças ou grupos armados receberam protecção ou apoio à reintegração durante o ano passado.
Com MadreMedia